sábado, julho 29, 2006

Oh Deus, ai dor, oh SUS, ai dependência.


Que fezes é a saúde pública do Brasil, estou pagando com a minha dor no estomago, a minha ignorância, imobilidade e ingenuidade, por não poder fazer nada. Preciso ter acesso à saúde e me é negado, a mim e tantos outros que tem a conta bancária igual a minha, ou não tem conta bancária.
Oh posto de saúde, ai fila no hospital, oh falta de médicos. É nisso que dá, votei sem pensar, votamos sem pensar, acreditar, apostar, nos deixamos enganar, depositamos neles nossa confiança, e eles pisam no tapete vermelho como Rei, e nós pisamos na lama vermelha como ninguém, que nem saúde tem.
Oh falta de medicamento, ai dor constante, oh falta de vagas. Dirijo-me ao hospital, gasto dinheiro do ônibus e tempo, bato de porta em porta para ser atendida em algum hospital de saúde publica, e o que vejo? Somente multidões de pessoas, em estados iguais ou pior que o meu, vegetando na fila de emergência. Cansada de esperar vou tomando chá, o que os antigos auxiliam tomar, é boldo de lá para cá, resta-me bolacha água e sal para me alimentar, nessa espera de um dia consultar.
Oh vida, ai dor, oh desalento, ai descaso. Depois de horas e dias de espera, consegui consultar, só resta fazer o exame para o problema solucionar. Dirijo-me a sala de “marcações” de consultas, uma jovem senhora me atende, lhe dei a requisição médica, para ela me dar o aval do exame de endoscopia, mas a decepção me corroeu quando me disse que não havia vagas, porém ela me perguntou se eu gostaria de colocar meu nome na lista de espera, a lista se resumia num livro e meu nome iria para o final dele, ou então a ultima alternativa era fazer particular, fitei-a com um olhar indeciso, e falei da minha indignação pela saúde pública, simplesmente ela me olhou e falou que o Sistema Único de Saúde é assim mesmo, aquelas pessoas que estavam na lista estão esperando há anos e ainda não foram atendidas, então com um ar de abatimento, disse-a que por favor não colocasse meu nome no livro da morte, que não iria esperar por algo que não vem, me levantei e sai.
Olhei para a receita que estava em minhas mãos, o que iria amenizar minha dor, fui cabisbaixa até a sala de medicamentos, um rapaz me atendeu, lhe entreguei a receita, ele olhou-me, pediu desculpas, pois não tinha aquele remédio, estava em falta, a previsão para receberem o remédio era de mais ou menos dois meses, quando eu iria abrir minha boca pra desabafar minha indignação, me faltou forças, tamanho o desapontamento. Como um cachorrinho que é enxotado de um local ou lhe negado comida, vou embora com as orelhinhas para baixo.
Oh Deus, ai dor, oh SUS, ai dependência.
Gabriela Jacinto

3 comentários:

Mario Davi Barbosa disse...

Ó Deus, ai dor, ó SUS! Que tristeza não? Mas essa é a nossa incrível desigual realidade. Esse texto conseguiu mostrar a realidade de quem depende de serviços públicos básicos e não pode usufruí-los por falta de investimento do Estado. Eu vivo me perguntando: "Como é que esse povo (eu eu me incluo aí) consegue se virar com tão pouco e ainda ter tempo pra ser feliz?" Infelizmente a resposta não me vem! Entre a fila do SUS, a fila para conseguir uma vaga na escola para seus filhos e a fila para tentar um emprego vive o brasileiro, mantendo a velha e fiel fé desse povo sofrido e a esperança de dias melhores.

Mario Davi Barbosa disse...

Não gostei dessa foto na postagem, mto forte, acho q não tem mto a ver com o texto!

Anônimo disse...

Adorei o texto. Sobretudo pela sua literalidade exacerbada! Frases aliterativas e onomatopéicas como "Oh posto de saúde, ai fila no hospital, oh falta de médicos", ou ainda "Oh falta de medicamento, ai dor constante, oh falta de vagas" que são fantásticas pois "gemem" de dor num lamneto conjunto com a saúde do povo/personagens do texto que não andam (bem) pelas filas dos sistemas públicos de saúde.
É uma crônica mas poderia se transformar num conto (meio crônico). Parabéns!
Álvaro Andreucci